sábado, 7 de agosto de 2010

M 286-OS MONGES CISTERCIENSES E AS FRUTAS DE ALCOBAÇA


Património Cisterciense – As Frutas de Alcobaça

Os monges cistercienses acarinharam a fruticultura. O profundo amor com que tratavam os seus pomares de laranjeiras doces e pessegueiros explica que para os designarem utilizassem a singela expressão de “jardim”, numa clara alusão ao paraíso celestial. A exploração agrícola das Granjas monásticas reservava um espaço para as árvores de fruto. Mesmo nas granjas de solos mais inóspitos, privados de águas de nascente e cravejados de pedra, as fruteiras marcavam posição.
A diversidade de árvores frutíferas repartia-se entre os pomares de espinho, caroço e pevide. Na resposta à questão sobre qual a qualidade dos pomares e a diversidade das árvores de fruta, Frei Manuel de Figueiredo testemunha-nos a sua inusitada riqueza: “Os Pomares constão de frutas chamadas de caroços principiando pelas primeiras frutas de cereijas, ginjas, alvoricoques, damascos [os “ovos do sol” dos Persas], athe as maçans, e peros de Inverno [frutas de pevide] que são mais raras, ainda que crião arvores de bastante corpo [e nos de espinho] laranjeiras doces, e agras, limeiras, cidreiras, limoeiros que dão limoens grandes e gallegos”.
Outros autores pronunciam-se sobre as fruteiras de Alcobaça. D. António Macedo fala do renome que conquistaram as laranjas de Alcobaça e as melancias de Pataias. Também João Maria Baptista, narra que chega “a todo o reino a fama dos bellos peros e camoezas e que os seus delicados pecegos egualmente merecem”.
Segundo Beckford no seu diário de viagem “Alcobaça e Batalha”, as primeiras laranjeiras da China que tinham vindo para Portugal foram plantadas no claustro de D. Dinis. O cultivo dos citrinos floresceu nas terras de Alcobaça. No relatório da Sociedade Agrícola do distrito de Leiria (1856) menciona-se que os pomares de espinho apenas existem nos concelhos de Alcobaça, Caldas da Rainha e no lugar da Barreira (Leiria) e que as espécies cultivadas são as laranjas da China, o limão acre e doce, a cidra, a lima, a laranja lima e a tangerina. Fazendo fé nas declarações de produção dos concelhos que integram o distrito de Leiria, no ano de 1865 Alcobaça contribuiu com 99% dos citrinos. A colheita da laranja ultrapassou os 806 milheiros e a dos limões alcançou os 50 milheiros.
Quanto às pereiras, J. B. de Castro informa-nos sobre as castas e designações populares. Temos então as “de rei, de conde, bergamotas, bojardas, carvalhaes, conforto, flamengas, gervasias, codornos, engonxo, S. Bento, bom cristão, virgulozas, lambe-lhe os dedos (…) ”. Iria Gonçalves recupera diversas qualidades de peros, nomeadamente os de Santiago, brancos, marmelares, e as maçãs baionesas, que pela sua excelência os monges elegiam nos foros.
As fontes do século XVIII dão conta da maçã leirioa (nomeadamente nas terras da Vestiaria), das deliciosas e aromáticas camoesas. Já o Relatório da Sociedade Agrícola do distrito de Leiria, que atribui ao concelho de Alcobaça o domínio incontestado dos pomares de pevide, ao pronunciar-se sobre as qualidades das maçãs, refere que nas temporãs “cultiva-se a leiriôa, a cerigal e outras. Das serôdias temos a olandeza, páu preto, bemposta, raineta, parda e vermelha.
O comércio dos frutos constituía uma mais-valia económica das terras de Alcobaça. A expedição dos frutos era feita por contratadores tendo como destinos preferenciais os mercados de Lisboa e das comarcas vizinhas. As frutas eram despachadas através da barra de S. Martinho. A importância deste porto na exportação das frutas explica que os afamados peros recebessem a designação do cais de embarque. Segundo J. Vieira Natividade, só no ano de 1854 foram exportadas 251 carradas de fruta verde (maçãs). Enquanto as laranjas e os limões tinham como destino a Inglaterra e o Brasil, as maçãs eram conduzidas para o Algarve e norte de África. Os concelhos vizinhos de Caldas da Rainha e Nazaré absorviam parte da produção, embora também se fornecessem os mercados de Lisboa, Santarém e Vila Franca.
A indústria da seca de frutos foi também bastante desenvolvida no território dos coutos, ganhando notoriedade os ramais de maçãs camoesas, as peras aparadas, as passas de ameixa. Entre as peras passavam-se as variedades almíscar, carvalhal, calvário e pé curto, nas ameixas destacam-se as caragoçanas, a branca de passar, a doçarina, a rainha-cláudia. Nos pêssegos a variedade molar. Também as uvas se penduram no barrotado da frutaria e os figos se dispõem nos balaios ao sol.
Eram populares os ramais de maçãs que se transaccionavam nas feiras e mercados da região e se exportavam para Santarém e Vila Franca. Estes frutos mirrados e doces eram ofertados às crianças pelo pão por Deus e serviam de mimo para os velhos e doentes.


António Valério Maduro

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