sábado, 26 de junho de 2010

M 269 - POSTAIS COM HISTÓRIA

OFICINA DANADA



Ano 2001, fim de tarde de um dia quente de Maio...


Dois homens de cabelos brancos passeiam lentamente aproveitando o fresco da noite que se avizinha mas que só deverá chegar dentro de uma hora !...

O mais velho fala, gesticula e de olhos brilhantes aponta para um edifício amarelo, degradado, com muitos anos de tempo, de memórias, de sons de martelos e de bigornas...



O interlocutor do vigoroso octogenário ,cerca de vinte anos mais novo, toma notas e de vez em quando interrompe com perguntas.

“Oficina danada”!...

Espera aí, José Coelho. Vamos falar desses nossos antepassados com mais calma e pormenor.

E com a magia de que os mais velhos são capazes aproveita-se a esquina mais próxima para se entrar na” máquina do tempo” e viajar 50, 100 anos para trás. Na casa amarela, ou seria branca, vamos encontrar uma família de hábeis serralheiros, representantes de uma das mais velhas e numerosas famílias de Alcobaça: -“OS COELHOS”.

Quatro irmãos (o Joaquim, o Zé “Preto”, o Júlio e o António “Russo” ),  serralheiros experientes, com oficina na Rua Frei Estevão Martins, frente à actual Pensão Mosteiro, viveram intensamente os tempos conturbados do assalto ao Quartel de Janeiro de 1919.

A página 137, do livro de Bernardo e Silvino Villa Nova, “Breve História de Alcobaça” é referido que em 11 de Janeiro de 1919, civis armados, auxiliados por oficiais revoltosos de Regimento de Artilharia 1, aquartelado em Alcobaça, tomaram posse do quartel, prenderam o Comandante e alguns oficiais e seguiram para Santarém, principal núcleo do movimento revoltoso.

No dia 13 seguinte, encontrando-se Alcobaça desguarnecida, entrou nela tropa de Infantaria 7, fiel ao governo, tendo-se seguido a prisão de largas dezenas de pessoas... e até 24 do mesmo mês viveu-se um regime de terror, com violação de domicílios e atropelos vários.

Pois também os quatro irmãos da nossa história e a sua oficina estiveram na mira das forças da ordem de então por terem sido denunciados por inimigos políticos. Eram acusados do fabrico de bombas para a revolução.

Foi um elemento da GNR, que no final da busca, certamente cansado, enfarruscado e desiludido por nada ter encontrado que proferiu a frase que veio a tornar conhecida a oficina dos 4 irmãos:- Que oficina danada!...

Quanto às bombas elas estavam lá perto, dentro de um cesto que, preso por um arame, estava mergulhado nas águas escuras do Rio Baça que passava nas traseiras da oficina.

Se têm aberto a janela enferrujada das traseiras e puxado o arame estes nossos parentes teriam ido mesmo presos.

Parafraseando a histórica expressão do soldado da GNR tiveram uma sorte danada!...

JERO

Nota: - O postal reproduzido é da Colecção Armazém das Artes (Rusga à Oficina Danada) e é da autoria de Rogério Ribeiro
2007
Tinta da China sobre papel


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